06/11/2024 - 13:30 - 15:00 RC9.12 - Avaliação de políticas, programas e tecnologias em saúde |
50520 - AVALIAÇÃO DO DESENHO, IMPLEMENTAÇÃO E RESULTADOS DO PROGRAMA CUIDAR MELHOR FREDERICA VALLE DE Q. PADILHA - INSTITUTO DE ESTUDOS PARA POLÍTICAS EM SAÚDE (IEPS), GUSTAVO SIMÕES CORDEIRO - INSTITUTO DE ESTUDOS PARA POLÍTICAS EM SAÚDE (IEPS), LEONARDO ROSA - INSTITUTO DE ESTUDOS PARA POLÍTICAS EM SAÚDE (IEPS), RUDI ROCHA - INSTITUTO DE ESTUDOS PARA POLÍTICAS EM SAÚDE (IEPS)
Apresentação/Introdução Programas de pagamento por resultados na área da saúde são iniciativas que vinculam incentivos financeiros ou penalidades a objetivos de qualidade e eficiência do sistema de saúde (Eijkenaar et al 2013).
Nesta lógica, as mudanças trazidas pela Lei 14.023/07 para a distribuição da cota parte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) no estado Ceará extrapolam os critérios demográficos e econômicos e se voltaram para o desempenho dos municípios em indicadores de saúde, educação e meio-ambiente.
Diversos estudos constatam que esta mudança gerou impacto positivo sobre indicadores de educação (Brandão, 2014), se refletindo na adoção da medida por outros estados. Contudo, nenhum efeito foi verificado sobre indicadores de saúde com o sistema vigente entre 2007 e 2020 (Carneiro e Irffri, 2021).
Neste contexto, o Programa Cuidar Melhor é uma iniciativa que teve início em 2021 que aumentou de 5% para 15% os recursos da cota parte do ICMS destinados aos municípios com base em indicadores de mortalidade, trazendo ainda um sistema de premiação para os 30 municípios (16% do total) com melhor desempenho em outros indicadores de saúde, nomeados de indicadores de esforço no âmbito do programa.
Objetivos O objetivo deste estudo é avaliar o Programa Cuidar melhor a partir das seguintes perspectivas:
● Desenho do programa: propriedade e adequação dos indicadores utilizados para a geração do mecanismo de incentivo proposto;
● Implementação: mudanças ocorridas na redistribuição dos recursos da cota parte entre os municípios e análise das características dos municípios premiados pelo programa;
● Resultados: avaliação de impacto do programa.
Metodologia Os métodos utilizados nas análises incluem estatísticas descritivas, análises de tendência temporal, correlações, distribuição espacial e modelos de inferência causal. Para avaliar a adequação dos indicadores utilizados no programa utilizamos análise de tendência temporal, correlações bivariadas e comparações de médias. Para análise da distribuição dos recursos da cota parte, utilizamos descrições a partir de mapas no nível dos municípios.
Para a avaliação de impacto do programa foi utilizado o método de inferência causal de Diferenças em Diferenças (DID) por meio da construção de grupos de controle e tratamento. Assim, comparou-se a evolução dos indicadores, antes e depois do programa, de municípios cearenses com municípios parecidos de estados vizinhos, porém, não submetidos à mesma regra de distribuição de ICMS.
Os dados utilizados foram todos retirados de bases públicas do SUS como o sistema de mortalidade (SIM), sistema de internações (SIH) e sistema de informação da atenção básica (SISAB) e os dados de finanças municipais são da Finbra.
Resultados e Discussão A redistribuição dos recursos a partir da implementação do programa mostrou que a parcela da cota parte do ICMS relacionada à saúde aumentou consideravelmente para todos os municípios entre 2021 e 2022, representando em média 1,5% da receita total dos mesmos. Contudo, alguns municípios perderam receitas quando considerada a integralidade da cota parte. Com relação a premiação relativa aos indicadores de esforços, os municípios contemplados mostraram uma renda per-capita e cobertura da atenção básica maior do que o restante.
A análise do desenho do programa mostrou que os indicadores de mortalidade utilizados possuem alta instabilidade de medição, ou seja, pequenas variações no número de óbitos têm um impacto grande no cálculo das taxas quando a população de interesse é pequena (Silva et al, 2011). Além disso, segundo a literatura, indicadores de mortalidade são raramente utilizados em programas de pagamento por performance e quando o são, focam geralmente casos diretamente atribuíveis ao desempenho hospitalar (Cashin et al, 2014), pois esses indicadores possuem pouca responsividade às ações dos municípios no curto prazo.
Os indicadores de esforço se mostraram mais estáveis e passivos de mudança relacionadas à atenção primária, que é de responsabilidade dos municípios. Contudo, a avaliação de impacto sobre esses indicadores não mostrou nenhum efeito do programa, resultado que deve considerar algumas limitações como: i) a maioria dos indicadores coincidem com os indicadores do programa de financiamento do governo federal, Previne Brasil, implementado no mesmo ano; ii) a descontinuidade da premiação em 2022, ocasionando uma possível falta de engajamento dos municípios e; iii) limitação do mecanismo de incentivo restrito a apenas parte dos municípios.
Conclusões/Considerações finais A análise do Programa Cuidar Melhor realizada neste trabalho destacou que, apesar da relevância dos recursos mobilizados, a instabilidade e a falta de responsividade dos indicadores utilizados para o rateio da cota-parte do ICMS os tornam inadequados para motivar a ação dos municípios. Por outro lado, parte dos indicadores de esforços, utilizados como um reforço ao mecanismo de incentivo do programa, se mostram mais em conformidade com as propriedades desejadas para esse tipo de programa.
Adicionalmente, a grande quantidade e variedade de indicadores utilizados e as diferentes formas de cálculo para distribuição dos recursos parecem ter ocasionado uma falta de compreensão sobre o programa por parte dos municípios.
Em suma, os resultados indicam a necessidade de uma revisão do desenho do Programa Cuidar Melhor e de seus indicadores, em conjunto com ações de comunicação e mobilização dos municípios, para o alcance do objetivo de melhorar a saúde local.
Referências BRANDÃO, J B. O rateio de ICMS por desempenho de municípios no Ceará e seu impacto em indicadores do sistema de avaliação da educação. 2014, Dissertação de Mestrado em Administração. FGV, Rio de Janeiro, 2014
CASHIN, C. et al. Paying for performance in healthcare: implications for health system performance and accountability. McGraw-Hill Education (UK),2014
CARNEIRO, D; IRFFI, G. Políticas de incentivo à educação no Ceará: análise comparativa das leis de distribuição da cota-parte do ICMS. Políticas públicas: avaliando mais de meio trilhão de reais em gastos públicos. Brasília: Ipea, 2018.
EIJKENAAR F. et al. Effects of pay for performance in health care: a systematic review of systematic reviews. Health Policy Amst Neth. 2013
SILVA SLC et al. Visualização dos padrões de variação da taxa de mortalidade infantil no Rio Grande do Sul, Brasil: comparação entre as abordagens Bayesiana Empírica e Totalmente Bayesiana. Cad Saúde Pública, 2011
Fonte(s) de financiamento: NIHR: National Institute for Health and Care Research
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